domingo, 16 de janeiro de 2011

CIMI reclama de negligência e critica “extermínio dos povos indígenas”

Falta de assistência à saúde e condições de vida favorecem mortalidade infantil indígena
Crédito: PCO29

O alto índice de mortalidade infantil registrado nas aldeias na nação Xavante, em Campinápolis/MT (denunciado há cerca de 30 dias por este blog com repercussão nacional) seria resultado do abandono, omissão e negligência do Governo Federal. A análise é do Conselho Indigenista Missionário, que denomina a situação de “extermínio dos povos indígenas”.

“Segundo noticiou a imprensa de Mato Grosso, das 200 crianças nascidas no ano de 2010, 60 morreram em decorrência de doenças respiratórias, parasitárias e infecciosas, o que corresponde a 30% do total de nascimentos do período”, diz o artigo.


E a indigenista completa: “Esta terra indígena está registrada desde 1987, mas a comunidade Xavante sofre com a falta de assistência adequada em saúde, já tendo casos de mortes por desassistência denunciados pelo Conselho Indigenista Missionário no Relatório de Violência contra os Povos Indígenas de 2009”.


As mais de 100 comunidades situadas na região do Médio Araguaia, acrescenta Iara, reclamam a falta de veículos, de medicamentos e de equipes técnicas para atender as mais de sete mil pessoas que vivem ali. A situação é precária, não há médicos, enfermeiros e nem meios de transporte para levar os doentes à cidade.


Tal como ocorre na terra indígena Vale do Javari, no Amazonas, os índices de mortalidade infantil na aldeia Xavante de Campinápolis chegam a quase 100 óbitos para cada 1.000 crianças que nascem. “Em outubro deste ano lideranças indígenas acamparam na sede da Funasa, protestando contra a falta de uma política adequada de atenção à saúde indígena. Apesar das diferentes formas de mobilização e de luta dos povos indígenas, no dia a dia o que eles encontram é o abandono e a omissão”, completa Iara Bonin, que é professora adjunta da Universidade Luterana do Brasil -Ulbra .

Para Iara, sejam quais forem as metas econômicas traçadas para o país, a morte de tantas crianças, pertencentes a povos tão massacrados historicamente, não pode ser considerada aceitável. E, sob nenhuma circunstância, a negligência com os direitos desses cidadãos do presente e do futuro pode encontrar amparo em uma sociedade que define a si mesma como democrática.
“Tal como o nascimento, na cultura ocidental contemporânea, a morte também pode adquirir diversos significados – mas a morte que decorre da omissão do Estado não pode, de modo algum, ser esquecida. Não há como calar a voz diante do extermínio lento e gradativo dos povos indígenas”, finaliza.

Fonte: Sandra Carvalho

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Para MPF, Belo Monte joga sustentabilidade no lixo

Hidrelétricas, Ministério Público
Fonte: (Diário do Pará, 05/01/2011)

A construção da hidrelétrica de Belo Monte, no centro do Pará, ainda enfrenta oito ações do Ministério Público Federal (MPF) pendentes de julgamento. Algumas têm decisão de primeira instância, mas nenhuma de segunda, o que significa dizer que o empreendimento, para sair do papel, depende da Justiça Federal. Segundo o procurador da República, Felício Pontes Junior, que encabeça todos os processos contra a usina, desde 2005, quando o governo Lula retomou o projeto do regime militar de fazer Belo Monte, assistimos a um “festival de irregularidades”.

Para Pontes Junior, o governo insiste em dobrar a legislação ambiental à sua vontade e é contra isso que o MPF vem se insurgindo desde 2001. “Infelizmente, os processos judiciais são muito demorados no país, o que acaba favorecendo a criação de fatos consumados e os princípios do direito ambiental, como a precaução, viram letra morta”, diz o procurador, que acusa o governo de estar criando “ritos sumários” para aprovação de empreendimentos de grave impacto, sem nenhum amparo na lei brasileira e desrespeitando até mesmo tratados internacionais.

Ele enumera cinco razões para que a hidrelétrica não seja construída: estudos mostram que a repotenciação de usinas já existentes e o investimento em melhoria nas linhas de transmissão significariam nove Belo Montes em produção energética a um custo econômico e ambiental infinitamente menor. Outro argumento é a admissão, pelo próprio governo, de que a usina, mesmo depois de construída, ficará parada a maior parte do ano. E questiona a razão de se causar tamanhos impactos numa região sensível como o Xingu, a custos altíssimos, para criar um elefante branco que quase não vai funcionar.

Sustentabilidade é o terceiro ponto: Belo Monte é de longe a obra com mais graves impactos ambientais da história do Brasil. O procurador aponta que 273 espécies de peixes estão ameaçadas com o “secamento” da volta grande do Xingu. Além disso, a água do rio, em Altamira, pode apodrecer, sem contar com a possibilidade concreta de haver remoção de povos indígenas, o que o governo não admite, porque se ocorrer, significa genocídio.

POLUENTES

O quarto motivo contrário à usina apresentado por Pontes Junior é a opção política feita pelo governo: quando o mundo inteiro discute novas formas de desenvolvimento, o governo brasileiro vai insistir em obras “megalomaníacas” em plena floresta Amazônica, aumentando as emissões de poluentes, atraindo contingente populacional e criando condições para aumentar o desmatamento novamente. Por fim, vem a justiça social. Segundo o procurador, não se pode permitir novamente o sacrifício de populações tradicionais em nome de um desenvolvimento duvidoso, que vai acabar favorecendo indústrias eletrointensivas em vez dos moradores da Amazônia.

A postura do MPF, porém, não impediu o governo Lula de tomar todas as providências e realizar o leilão da usina. O procurador acredita que a eleição teve influência nessa decisão. Para ele, o objetivo de tanta pressa, violência e falta de rigor técnico era fazer o leilão da obra antes das eleições, já que na prestação de contas da eleição, as empreiteiras, maiores beneficiárias de Belo Monte aparecem como principais doadoras de todos os candidatos.

Pelas informações do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Camargo Correia e Andrade Gutierrez, que vão construir a hidrelétrica sem correr nenhum risco porque se retiraram do leilão, doaram juntas mais de R$ 120 milhões para várias candidaturas. As empreiteiras participaram com 27% da receita da campanha da presidente Dilma Rousseff.

Se a sociedade e a Justiça brasileira permitirem a construção da usina, afirma o procurador, esse momento será lembrado no futuro como aquele em que o Brasil “jogou no lixo” a chance de construir o desenvolvimento sustentável na Amazônia.

Medo entre os índios

Data: 05.01.2011

A violência nas comunidades indígenas tem aumentado nos últimos anos. Na reserva de Dourados, em Mato Grosso do Sul, as famílias vivem com medo dentro das próprias casas.

A índia kaiowá Lourdes Braga está de luto pela morte do filho de 20 anos. O jovem foi torturado e morto com um tiro nas costas. "Ninguém tem dó, não. Chegou a noite, ninguém tem dó”, disse.
A família kaiowá mora na reserva de Dourados, em Mato Grosso do Sul, estado que lidera o ranking da violência indígena. O levantamento mais recente, de 2009, mostra que dos 60 assassinatos de índios no Brasil, trinta e três ocorreram no estado.

Indigenistas acreditam que o aumento da violência nas aldeias está diretamente ligado à diminuição do território do índio. No século XIX, por exemplo, as etnias terena, guaraní e kaiowá tinham cinco milhões de hectares para viver na região. Hoje, os cerca de 15 mil índios do município de Dourados dividem duas reservas de 3,5 mil hectares.

"Nosso antepassado não vivia assim, não. Eles tinham de andar uma semana pra chegar ao vizinho. Hoje só um passo aí, você sai da casa e você já vê a casa do vizinho”, contou Getúlio Juca Oliveira, cacique caioá.

“Alguns não tem nem onde construir a própria casa. Eles têm alguma assistência à saúde e à educação, mas falta ainda outras políticas públicas voltadas para eles”, explicou o antropólogo Jorge Heremites.

Segundo um levantamento da Polícia Militar, só no ano passado ao menos 16 índios foram mortos vítimas de agressão na reserva de Dourados. Por lei, só policiais federais podem entrar em terras indígenas.

O problema, segundo as autoridades, é que a Polícia Federal não tem efetivo para o patrulhamento. Por isso, a Funai e a Polícia Federal estudam um acordo com o governo estadual para que a Polícia Militar faça um policiamento ostensivo nas aldeias de Dourados.

“O grande problema da Polícia Militar é que não temos a competência de oferecer o nosso serviço, que é o policiamento ostensivo preventivo, dentro das aldeias. Mas nós acreditamos que, com a documentação que já foi encaminhada para Brasília e com o termo de cooperação da União e do estado, essa competência será estendida às polícias militares pelo menos aqui no Mato Grosso do Sul”, esclareceu o coronel Marcos David, comandante da Polícia Militar em Mato Grosso do Sul.

“Nós precisamos também, neste caso, resolver definitivamente as atribuições e poder atuar. Não podemos ficar na situação que está hoje. Os índios estão sendo assassinados. Há problemas de violência graves no âmbito da comunidade, como a questão do abuso do álcool e do uso das drogas, e o estado não atuar. O estado democrático de direito tem que atuar nos três níveis”, lembrou Márcio Meira, presidente da Funai.

No domingo, mãe e filha foram assassinadas na aldeia, mortas a facadas. A polícia suspeita de latrocínio, roubo seguido de morte. Esse tipo de crime é comum na reserva.

“Nós esperamos que já no primeiro trimestre haja pelo menos uma atuação mais intensiva tanto da Força Nacional quanto da Polícia Federal nas aldeias de forma preventiva. O que esperamos que vá minorar a situação dos indígenas. O atendimento preventivo depende da celebração de um termo de cooperação. Infelizmente, há um limbo jurídico porque a comunidade é muito próxima da cidade. Então, nenhuma das polícias entende que é competente para a efetivação do policiamento preventivo. Com esse convênio, esperamos que essa situação seja resolvida. Esperamos que haja por parte da Polícia Federal e da Força Nacional, juntamente com a Polícia Militar, a efetivação de operações que visem a prevenção, principalmente o combate ao tráfico de drogas e à receptação de produtos na aldeia”, disse Marco Antônio Delfino, procurador da República.


Lula homologou nos oito anos de governo 81 terras indígenas

30/12/10 - 17:49 > POLÍTICA
Fonte: Agência Brasil

 
BRASÍLIA — O portal do Comitê de Organização de Informações da Presidência de República (https://i3gov.planejamento.gov.br/coi/ ) contabiliza que o governo Lula homologou, até 2009, 81 terras indígenas (TI) o que equivale a uma área de mais 18,6 milhões de hectares. O número difere das contas do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) que calcula que desde 2003 foram homologadas cerca de 14,3 milhões de hectares.

 
Segundo o Cimi, qualquer uma das medidas deixa o governo Lula abaixo das áreas homologadas pelos governos Collor/Itamar (31,9 milhões de hectares) e os dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso (36 milhões de hectares). A homologação, feita por decreto do presidente da República, é a penúltima etapa no processo de demarcação de uma TI, antes do registro em cartório e após os estudos de identificação, contestação, declaração de limites (portaria do Ministério da Justiça) e demarcação física.

 
Para o vice-presidente do Cimi, Roberto Antonio Liebgott, o “governo Lula quebrou um pouco as expectativas do movimento indígena”. Ele atribui as dificuldades de homologação às pressões de setores econômicos (como o agronegócio) sobre o governo e os recursos na Justiça contra os processos de demarcação. “São dois fatores bem combinados. Quando se supera um, se atravanca no outro Poder”, avalia.

Além da frustração quanto às homologações, o período 2003-2010 foi marcado por extrema violência contra os índios. “Foram centenas de conflitos com uma média de assassinatos de pelo menos 50 indígenas por ano”, calcula Roberto Liebgott. Nas contas do Cimi, o pico de homicídios ocorreu em 2007, quando foram mortos 92 indígenas.

Um dos focos de violência foi o Estado de Mato Grosso do Sul (MS), onde a Fundação Nacional do Índio (Funai) iniciou, em 2008, estudos para demarcar seis terras indígenas nas bacias dos rios Apa, Dourados, Brilhante, Ivinhema, Iguatemi e Amambaí nos primeiros meses de 2011. No estado, cerca de 3 mil índios (Guarani Kaiowá e Guarani Nhandéwa) vivem em 22 acampamentos montados à beira de rodovias.

 
Para muitos indigenistas a situação no MS é pior até mesmo que na Raposa Serra do Sol (RR), onde os produtores de arroz protelaram por anos com recursos na Justiça até que o Supremo Tribunal Federal confirmasse a homologação feita pelo presidente Lula.

O ativista do Cimi avalia que durante o próximo governo as entidades do movimento indígena deverão “apresentar uma pauta de demandas” e exigir “assistência diferenciada que até hoje não existe”. Ele, no entanto, pondera que os indígenas devem se articular melhor. “Isso não vai acontecer do dia para a noite”, disse antes de lembrar que durante a campanha eleitoral a questão indígena “ficou à margem [dos debates]”.